Foram duzentos e vinte dias que me deste
(duzentos e vinte e quatro pra maior exactidão)
...foram sete meses que perdeste
em busca de uma ilusão.
Quantas vezes to pedi que não fizesses,
quantas vezes tentei que não me desses
mais do que o dia-a-dia...
(se é que mesmo esse pouco eu achasse que merecia)
...e agora o fogo morreu, o lume apagou,
mais só fiquei eu, e mais pobre tu...
roubei-te a riqueza da fé nas pessoas,
levei-te a ver feio o que achavas belo
e mesmo sem quere-lo
ficaste também
tu própria mais só!
Foram horas boas,
nem todas mas muitas,
mil vezes por cinco e ainda trezentas,
e se as não lamentas
bendita sejas na tua bondade,
que por mais que eu viva uma eternidade
de sonhar de ti esta dor sem fim,
nem dez vezes todas, as horas passadas,
vão matar em mim
esta enorme saudade!
Vi-te dez vezes e cem e duzentas
estender a mão sem medo ou vergonha
ao fundo mais fundo dos meus mil vazios
e aquecer de amor a dor dos meus frios...
Sempre esse afago de mãe e irmã,
vestida de amante, despida de ti,
me trouxe o descanso de não estar tão só
como quem dorme, como quem sonha
na paz de um agora eterno e feliz
sem memória de ontem e sem amanhã...
...e então, de repente, todo este sonho se desfez em pó...
partiste de mim, qual nuvem de fumo
que não entendi
e fiquei sem rumo
e fiquei sem ti...
Mas houve uma coisa, uma coisa apenas,
que deixaste aqui para que eu não me esqueça
das horas serenas,
das coisas pequenas
que quando mas deste me foram tão grandes:
a recordação, a memória viva
da tua presença no meu pensamento!
E mesmo que eu seja para ti o lamento
de coisa passada, de coisa nociva,
e mesmo que agora entendas achar
que cada minuto de ti não mereça,
e já te pareça que te foram sete
esses longos meses que em mim te perdeste...
mesmo assim, para mim,
foram duzentos e vinte dias que me deste.