 | PÁGINA DE IMPRENSA DE PEDRO LARANJEIRA |  |
28-29 setembro 2007 |
CONFERÊNCIA
INTERNACIONAL
EUROPA-ÁFRICA
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Dedos nas feridas, caminhos traçados, estratégias propostas...
...e a presença dos dois últimos entrevistados da Perspectiva
por Pedro Laranjeira
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A Fundação Portugal-África organizou em Serralves, no Porto, uma Conferência Internacional subordinada ao tema "Europa-África: uma estratégia comum?" que pretendeu ser uma reunião preparatória e um contributo para a Cimeira UE-África, prevista para 8 e 9 dezembro, em Lisboa.
A importância da cimeira, que será a segunda a acontecer (a primeira foi no Cairo, em 2000, também sob presidência portuguesa da UE), está ensombrada pela questão da vinda de Robert Mugabe, Presidente do Zimbabwe, que muitos preferiam ver a responder em Tribunal por violação de direitos humanos do que numa conferência internacional em solo europeu. Gordon Brown, o sucessor de Tony Blair à frente do governo britânico, afirmou que não compareceria se Mugabe estivesse presente.
Esta polémica foi tema frequente de inúmeras declarações vertidas nos dois dias da Conferência perante um público interessado, que encheu o vasto auditório, participou nos debates e aprendeu testemunhos de muitas e bem informadas fontes.
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Logo no início, Mário Soares, Presidente da Fundação Portugal-África, apontou o dedo à Europa por funcionar "em torno do seu umbigo", exortando-a a assumir-se como parceiro estratégico do mundo e das economias emergentes, tanto mais que, na sua opinião, a triângulo Estados Unidos, Japão e União Europeia já não existe, muito por força do desenvolvimento chinês e indiano. Explicou que mesmo o taxa de 5% anual de crescimento em África não beneficia o seu povo, dilui-se nos meandros da corrupção e das más governações.
António Monteiro e o ex-Secretário Geral da ONU
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O antigo Secretário Geral das Nações Unidas, Boutros Boutros-Ghali, apontou como maior ameaça a África o isolamento e marginalização por parte da comunidade internacional.
Como exemplos da desatenção exterior, lembrou os genocídios do Ruanda e do Burundi e pôs o dedo na ferida-Darfour.
Acusou os países desenvolvidos de transferir as atenções e os investimentos para a Ásia e citou números que retratam o que se passa no continente: em trinta anos, a imprensa passou de 72 correspondentes em Nairobi para 4 e os operários fabris da indústria sul-africana de calçado passaram de 320 mil para 50 mil devido à concorrência chinesa.
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Fizeram parte do painel, entre outros, Lopo do Nascimento, antigo Primeiro Ministro de Angola e ex-Secretário Geral do MPLA, António Vitorino, ex-Comissário Europeu para a Justiça, José Manuel Briosa e Gala, em representação de Durão Barroso, José Tadeu Soares, da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e António Monteiro, Embaixador, antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros e africano por nascimento, que é o responsável pela coordenação da Cimeira UE-África em dezembro.
Briosa e Gala enfatizou a necessidade de desarmamento, de travar a proliferação de armas, o terrorismo e os vários tráficos, o comércio ilícito de riquezas naturais, a impunidade, a violação de direitos humanos e a corrupção.
António Monteiro explicou a importância da democratização dos países africanos e a sua conjugação com a Europa, acrescentando, sobre a Cimeira que é de sua responsabilidade, que ela se realizará independentemente da presença do Presidente do Zimbabwe.
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Mário Soares, Boutrus Boutrus-Ghali e Carvalho da Silva
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Lopo do Nascimento e Fernando Gomes
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Sobre este tema, Gala disse que "Mugabe não é a única pessoa que nos embaraça" e acrescentou que espera que ele se sinta incomodado e seja confrontado com a situação que se vive no seu país, mas preferia que ele decidisse não comparecer.
Por seu lado, Mário Soares comentou que não é um grande drama Gordon Brown não vir, pode fazer-se representar, hipótese entretanto desmentida pelo chefe do executivo britânico.
O Ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, encerrou os dois dias de trabalhos com um forte apelo ao reforço das relações com África, por forma a dotar o continente dos meios indispensáveis para beneficiar do fenómeno da globalização.
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DOIS ANGOLANOS QUE SE OPÕEM AO REGIME
...E QUE A PERSPECTIVA JÁ TINHA REVELADO
Presentes na assistência, estavam dois peões da realidade angolana, retratados nos últimos números da Perspectiva: Luiz Araújo, activista em constante movimento, que foi grande entrevista e forneceu a capa da nossa edição número 4, bem como Pedro Romão, que muitos consideram um potencial futuro líder, entrevistado no nosso último número.
Como tinha acabado de ouvir, lá dentro, que os governantes mais ricos, não confiando nos seus próprios países (ou no futuro deles) investiam no estrangeiro e colocavam os seus bens fora das fronteiras, perguntei-lhe se haveria caça às bruxas um dia que o poder mudasse de mãos. A resposta foi firme e concisa:
"De maneira nenhuma! Entendo que isso é um elemento fundamental para a transição política, ou seja: a transição política não se faz só com o perdão político e militar - aqueles que se guerrearam beneficiarão de uma amnistia e não vamos nós fazer caça às bruxas nem pôr ninguém nas cadeias.
A transição política faz-se também com o perdão económico.
Eu não preciso, para construir uma Angola diferente, de pôr em causa a riqueza, feita lícita ou ilicitamente, por essa gente que governa hoje o país... e se investirem no país o dinheiro que têm, vão ganhar muito mais!
Eu acho que o José Eduardo nunca se sentiria feliz fora de Angola, acredito que no dia em que ele se sinta em paz , vai pôr o dinheiro todo que tem no país.
O importante para mim é que se consume a transição política.
Quero que todos os cidadãos se sintam à vontade e não sintam que poderão ser perseguidos!
Eu nunca faria isso!"
Perguntei-lhe ainda quanto tempo estimava que podia demorar a mudança... respondeu-me, sem hesitar:
"Eu pessoalmente acredito que num espaço de 15 anos!"
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Pedro Romão: "não vamos fazer caça às bruxas"
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Luiz Araújo: "Eu sou pequenino, não vou ser governante, podes crer! Não tenho os mínimos olímpicos para ser governante!"
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Quanto a Luiz Araújo, com boné à Fidel e todo vestido de branco, provocou agitação nos debates, ao ponto de Mário Soares intervir para afirmar que ele, pessoalmente, não podia ser incluído nas acusações que Araújo dirigiu a alguns dos presentes, nomeadamente de omissão face aos problemas africanos.
Sedento de uma revolução sem armas, também ele, tal como Pedro Romão, não aspira ao poder, mas as suas palavras são o espelho do fogo activista que o caracteriza.
Ficou a pairar durante muito tempo a frase com que, num riso, resumiu tudo:
"Não vou ser governante, podes crer! Não tenho os mínimos olímpicos para ser governante!"
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