A tragédia acontece, em qualquer sítio do mundo, em Portugal também.
Há semanas que Madeleine McCann é primeira página e abertura de noticiários em todo o mundo. A cadeia britânica Sky News, fez dela reportagem 24 horas por dia. O Algarve recebeu um exército de jornalistas, de vários continentes, as reportagens saíram em directo da Praia da Luz para o planeta inteiro.
O drama da uma criança desaparecida, a juntar-se a tantos com desfechos trágicos mas a mais ainda sem desfecho sequer, confundiu-se com uma mediatização ora louvada ora criticada, que foi do sórdido explorador do sofrimento alheio ao mais sério rigor jornalístico.
Como em tudo o que chega aos povos com grande dimensão de importância, este caso tem servido para aprender lições sobre a casa assaltada e sobre as trancas que a porta precisa.
No concreto, os primeiros arguidos da opinião pública foram a polícia e a comunicação social.
Da última, chegou-se a consenso - internacional, acentue-se - que foi a portuguesa que se portou bem.
Uma certa imprensa inglesa tentou denegrir a imagem do país, quer pela avaliação da segurança em Portugal quer por críticas à actuação das autoridades. Vê-se agora diminuída na sua própria credibilidade perante o confronto, que teve de lhe ser apontado, da diferença de resultados obtidos, em casos semelhantes, pela nossa polícia e pela deles.
É esse o cuidado que o jornalismo deve ter: não falar sob a emoção do drama, mas apenas no relato dos factos.
Essa imprensa não aprendeu em tempo útil dois factos importantes e verificáveis: que a comunidade inglesa que vive no Algarve não é da mesma opinião e se integra perfeitamente com a portuguesa, por um lado; por outro que a "insegurança" que tentaram colar ao turismo em Portugal, levou a que lhes fossem expostos dados que deviam conhecer, como jornalistas. Quando o foram, com números, estatísticas e factos, ficaram a saber... que Portugal é o país mais seguro da Europa.
A maioria da imprensa estrangeira que nos visitou, porém, portou-se com dignidade.
No lado bom das coisas, aprendeu-se a usar a Internet como poderoso instrumento ao serviço das sociedades, ao mesmo tempo que se atingiram novos planos de consciência quanto ao lado negro dos seus perigos.
Aprendeu-se que o segredo de justiça da lei portuguesa e dos países nórdicos, tal como a investigação transparente dos ingleses, são opções com virtudes e desvantagens, mas que, acima de tudo, é preciso respeitar as regras da casa onde se está.
Finalmente, enquanto a opinião pública foi confrontada com as muitas razões possíveis para o desaparecimento de uma criança, aprendeu-se uma lição fundamental:
É melhor prevenir que remediar - e, ao fazê-lo, percebeu-se uma lacuna tremenda que é urgente colmatar: o atraso sistemático da legislação face ao evoluir das novas tecnologias da sociedade de informação, que não está alheia - agora percebe-se - ao planeamento e execução de actos destes.
O crime vai um passo à frente da lei... de vez em quando a tragédia abre-nos os olhos para isso.
Se a comunicação social e a polícia são uma mais-valia em casos destes, o legislador é o próximo responsável a ter que sê-lo também.
Porque, enquanto os gestores da sociedade não se adequaram à face negra da humanidade, continuarão a desaparecer crianças... e essas obrigam - obrigam - a que os responsáveis o sejam.
Madeleine McCann não pode ser uma cara com uma interrogação, deve ser um sorriso que os pais vejam!
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