Um grupo de cientistas franceses emitiu um estudo independente que revela toxicidade perigosa para a saúde humana numa variedade de milho transgénico, denominada MON 863, em circulação na União Europeia.
Esta variedade de milho é produzida pela multinacional americana Monsanto, que controla 80% do mercado mundial de plantas geneticamente modificadas e contém um insecticida (Cry3Bb1, uma endotoxina delta) destinado a conferir-lhe resistência ao crisomelídeo radicular e que é um veneno mortal para insectos coleópteros.
Os estudos toxicológicos iniciais foram feitos pela própria empresa, que forneceu também os quadros científicos de monitorização e, depois, os quadros de avaliação dessa monitorização, todos eles, portanto, quadros da própria produtora. O documento, com mais de 1.100 paginas, foi apresentado à União Europeia como considerando o MON 863 inócuo para a saúde humana e a planta foi autorizada pela Directiva 2001/18 para uso em rações e pelo Regulamento 1829/2003 para alimentação humana.
O estudo agora divulgado é o primeiro feito por uma equipa científica independente, dirigida pelo cientista francês Gilles-Eric Seralini, publicado no jornal "Archives of Environmental Contamination and Toxicology" sob o título "New analysis of a rat feeding study with a genetically modified maize reveals signs of hepatorenal toxicity" . Segundo esse documento, os ratos alimentados durante três meses com o milho transgénico sofreram danos renais e hepáticos, bem como alterações no crescimento.
Uma extensa campanha de divulgação deste perigo potencial tem sido feita pela Greenpeace a nível mundial e pela Plataforma "Transgénicos Fora" no nosso país, que pede a retirada imediata do mercado de todos os produtos derivados do MON 863 e a reavaliação das restantes variedades de transgénicos já autorizadas na União Europeia.
Gualter Baptista, da "Plataforma" classifica esta situação como "o golpe final na credibilidade do sistema europeu de autorizações" e, numa proposta que faz recordar certas intenções do estado português relativamente a assuntos fiscais, que vão já rondando perigosamente a proximidade dos assuntos penais, propõe que "agora os transgénicos têm que ser considerados culpados até haver provas de que são inocentes" - uma interpretação da inversão do ónus da prova que dá que pensar, tanto mais que já tem vindo a ser aplicada aos produtos químicos.
O milho, usado como alimento humano e animal, serve também para o fabrico de adoçantes, xaropes, gomas, cereais de pacote, lacticínios, pastilha elástica, óleos e fermentos. Entra na composição de rações para gado, porcos, aves, ovelhas, peixes e animais domésticos. Os seus derivados entram no fabrico de uma variedade de produtos, que vão do papel reciclado aos cosméticos, de tintas a antibióticos e alimentos para bebé - o que significa que chega virtualmente a todo o lado e a todos nós.
Se fosse cumprida com rigor a determinação do ponto 40 da Directiva 2001/18, todos estes artigos deveriam rotular a informação "Este produto contém organismos geneticamente modificados", extensiva a todos os sub-produtos, conforme os pontos 17 a 23 do Regulamento 1829/2003.
Ora isto não acontece, por malabarismos de excepções que dispensam o pacotinho da pastilha elástica de ter o aviso, mesmo que na origem de um dos seus componentes tenha sido usado MON 863. Muitas rações são rotuladas, mas o consumidor, que compra o produto final - o animal que se alimentou delas - não sabe disso.
Segundo Margarida Silva, especialista em transgénicos da Quercus, "Se há alguma coisa que temos que aprender com a crise das vacas loucas é que aquilo que os animais comem nos pode afectar e até matar".
Esta é uma falha grave na determinação comunitária de que os consumidores devem ser informados de modo claro e inequívoco das características dos produtos no mercado, com particulares obrigações para produtos geneticamente modificados ou que deles derivem.